Viagem ao Irã: Aventuras em Kandovan e Tabriz

Janaina, à noite no parque Shah Goli, em Tabriz.

Salam amigos, hoje vou falar dos lugares fantásticos que tive a oportunidade de conhecer na província do Azerbaijão Oriental.

📆 Tabriz, Irã – 30/08/2013:

Às 9hs, Mohsen e os outros dois rapazes vieram me buscar no apartamento de Firuze khanom. Foi a primeira vez que saí só com meninos no Irã. Fomos no mesmo carro do motorista que me buscou na rodoviária no dia anterior e não houve problema nenhum de eu me sentar no banco de trás com eles. Como era sexta-feira, muitas famílias estavam indo passar o dia em Kandovan.

Para chegar a esse local turístico enfrentamos um baita congestionamento e o calor estava de rachar. Assim como Masulehaquele mundo exótico de casas nas rochas, está cedendo lugar para construções modernas em alvenaria. Em Kandovan é tudo árido e poeirento. As escadarias tem muitas pedrinhas escorregadias e há lugares que é necessário ajuda das mãos para subir. Era uma cena cômica, a cada dois passos eu e os rapazes deslizávamos como se estivéssemos de patins nas subidas do vilarejo.

Apesar de sua atmosfera rústica, Kandovan tem um charme todo especial que encanta os visitantes. Muitas lojinhas de artesanatos, algumas dentro das cavernas com pouca luz e onde era difícil respirar e olhar as coisas com tanta gente. Para mim os itens eram meio repetitivos, inclusive artigos que já vi em Masuleh, especialmente as bolsas e outros artesanatos. Acabei comprando apenas uma singela capinha de celular de veludo bordada à mão.

Percorremos várias vielas, onde há casas desabitadas, cavernas que servem de abrigo para galinhas e outras onde podemos simplesmente nos abrigar do sol ou ter uma vista privilegiada da vila. Há um trecho onde a estrutura é precária, e há um imenso vão entre as escadarias sustentadas por andaimes, onde qualquer desatenção é risco de uma queda enorme na certa.

Subimos até o topo da vila, onde dá para ver uma paisagem montanhosa de tirar o fôlego, ali no alto tudo é silêncio e paz. Os rapazes escalavam as pedras para demonstrar sua coragem enquanto eu necessitava do gentil apoio deles para subir os barrancos. Na descida não teve jeito, os meninos tinham que segurar as minhas  mãos toda hora. E vez ou outra, um vento teimava em arrancar o meu véu.

Kandovan, um vilarejo histórico na província do Azerbaijão Oriental | Foto: Janaina Elias
Em Kandovan, construções recentes dividem espaço com as casas nas rochas | Foto: Janaina Elias
A atmosfera rústica de Kandovan encanta os visitantes | Foto: Janaina Elias
Janaina, na caverna, fugindo do sol implacável em Kandovan.
Os amigos Saman e Mohsen exibem sua coragem escalando as rochas.

Como o calor estava insuportável, sentamos em uma lanchonete para tomar sorvete e descansar. Pedi o sabor de talebi (cantalupo) com anar (romã) que eu tanto apreciei em Talesh. Com os três rapazes eu me sentia segura, como se eles fossem meus irmãos. Eram meninos simples mas a atitude deles para comigo era de verdadeiros cavalheiros. O mais sério era Saman, o primo de Mohsen, que usava camisa de mangas compridas e estava sempre com o tasbih nas mãos. Mohammad o mais velho, falava um pouco de inglês, tinha um sorriso amigável e no carro se preocupava em me deixar confortável ao abrigo do sol. Mohsen também era meigo e bastante comunicativo. Eles elogiavam meus poucos conhecimentos de farsi e faziam perguntas sobre o Brasil, lugar que para eles era uma grande incógnita, exceto é claro, pelo futebol.

Atravessamos uma ponte até o outro lado do riozinho que corta a vila, onde há um bazar de tendas que também é lotadíssimo. Mohsen me contou que há anos ele não visitava Kandovan, e desde a última vez que veio, muitas coisas haviam mudado. O bazar estava maior e o vilarejo mais lotado, mas especialmente porque sexta-feira é dia de descanso no Irã. Em Kandovan também vemos o doce lavâshak que é vendido em grandes pedaços embrulhados em folhas de plástico por toda parte. Enquanto Mohsen e os meninos comiam o lavâshak em duas mordidas, eu fazia um tremendo esforço para consumir aquela iguaria de sabor azedíssimo.

Depois de Kandovan, ainda teve mais emoções! Fomos ao teleférico na montanha Eynali que fica no norte de Tabriz. Eu nunca havia andado de teleférico na vida. A vista desta montanha de terra avermelhada é maravilhosa, não fosse o medão que dá do grande abismo onde ficamos suspensos há não sei quantos mil metros de altura. Ali na cabine tem que ficar sentado, quietinho, porque o “trem” balança sem dó!

 No alto da montanha pegamos um micro-ônibus que nos leva há um parque em construção, um memorial dos shahids e uma imamzadeh (espécíe de santuário) onde os meninos entraram para rezar. Diante de um túmulo com uma estrutura similar aquela do Imam Reza, eles fazem uma prece e depositam dinheiro. Eu fiquei só sentada ali quietinha no tapete, observando admirada o respeito e a reverência que eles tinham com aquele lugar.  

A montanha Eynali, norte de Tabriz vista da cabine do teleférico | Foto: Janaina Elias
Na cabine do teleférico, chegando no alto da montanha Eynali em Tabriz | Foto: Janaina Elias
Janaina com medo de altura, na cabine do teleférico na montanha Eynali, em Tabriz.

Na saída, ao passarmos por uma lanchonete em construção, havia um escada inacabada onde empilharam blocos soltos. Os meninos pularam por cima dos blocos sem nenhuma dificuldade. Quando chegou minha vez, botei o pé em um bloco que escorregou e eu me espatifei no chão. Ralei o braço, derrubei minha garrafa de suco em um barranco e minha calça ficou coberta de terra. Enquanto Mohsen estendia a mão para me levantar, eu não sabia se ria ou se chorava de tanta vergonha… E uma família que lanchava tranquilamente ali, perguntava se eu havia me machucado. Passado o susto, pegamos o micro-ônibus novamente, descemos a montanha no teleférico ao som da animada música pop azeri.

Voltamos para Tabriz onde almoçamos um kebab de carneiro com tomates e um pão lavash finíssimo que parecia uma massa de pastel cheio de bolhinhas de ar. Conforme o combinado, à tardinha eles me deixaram de volta na porta do apartamento da “minha família” e nos despedimos. Deixei meus contatos com Mohsen mas infelizmente, ainda não obtive nenhuma resposta dele. Queria muito agradecer a ele e aos outros rapazes por sua grande gentileza e respeito.

Em Tabriz a aventura não pára! Depois de um banho e um breve descanso, a família me convidou para visitar o famoso parque Shah Goli. Saí em um carro junto com a bela Tara e o seu irmão mais novo Aras. O garoto tinha o pé enfaixado porque se machucou dançando!

Mais tarde encontramos o amigo de Tara, um rapaz chamado Shahin, que também falava inglês, um desses azeris orgulhosos que diz: “Nós estamos no Irã, mas não somos persas, somos turcos”. Ele parecia insatisfeito com a falta de liberdade em seu país e me fazia perguntas do tipo: “No seu país você bebe álcool, vai à baladas?”. Eu respondi a ele que tenho liberdade para fazer isso, mas essas coisas não me atraem. Por fim, ele não conseguia entender porque eu escolhi visitar primeiro o Irã e não outro país.

Parque Shah Goli (El Goli), em Tabriz | Foto: Janaina Elias
O edifício histórico que hoje abriga um restaurante no parque Shah Goli | Foto: Janaina Elias
Uma das fachadas do edifício do restaurante no parque Shah Goli | Foto: Janaina Elias

O parque Shah Goli (que atualmente se chama El Goli, mas o povo continua a chama-lo pelo nome antigo), é menor do que parece nas fotos, mas não deixa de ser lindo com seu grande lago artificial onde navegam pedalinhos. No centro do lago há um restaurante histórico construído entre as dinastias Aq Qoyunlu e Safávida. Um audio-guide explica em várias línguas sobre o parque. Não consegui terminar de ouvir, porque algumas crianças, achando divertida a voz no alto falante, apertavam todos os botões em turco, árabe, francês e inglês ao mesmo tempo…

Entramos no parque no finalzinho da tarde e quando acabamos de dar a volta no lago já havia escurecido. Na ponte que nos leva ao restaurante, nos reunimos com os outros membros da família. Logo chegaram outros parentes que adoraram tirar fotos comigo. Para mim, uma das novidades de Tabriz, era o frio que fazia ali à noite. Aliás, fiquei sabendo que Tabriz é uma cidade onde faz frio 9 meses no ano e até mesmo no verão.

Quando a família forrou a lona no gramado e começou a cortar as frutas para o tradicional piquenique  no parque, começou a cair uma garoa. Como eu ainda não estava completamente curada do resfriado, usei o casaco flanelado que eu vim de São Paulo pela primeira e única vez no Irã. Todos correram para guardar as coisas de volta no carro e eu pensei que voltaríamos para casa, mas não…

Era por volta das 22:00, quando a família subiu uma colina, parou em um quiosque qualquer e montou o piquenique ali mesmo. Preocupados em me proteger da friagem, colocaram um monte de casacos e cobertores em  cima de mim. Comíamos sanduíche com pão baguete e um tipo de salsicha. O sanduíche iraniano é tamanho família, só que para uma pessoa só! Como ainda não consigo encarar o dugh, preferi a cerveja sem álcool sabor pêssego que até as crianças amam.

O que me chamou a atenção mais uma vez, foi o fato de estarmos sentados ali em uma estrada quase deserta, tão tarde da noite sem nenhuma preocupação com assaltos ou violência. Além do mais, o parque Shah Goli também fica aberto 24 horas por dia e as famílias iranianas saem para passear qualquer hora da noite sem medo.

Vista do Luna Park em Tabriz, do alto da roda gigante | Foto: Janaina Elias

Depois Shahin me convidou para ir com Tara e as crianças dar uma volta pela cidade. No carro ouvíamos música pop no último volume, as crianças cantavam, batiam palmas e faziam a maior bagunça, a alegria deles era verdadeira e contagiante.

Era quase 1:00 da madrugada quando paramos no Luna Park, um famoso parque de diversões em Tabriz. Andamos de montanha russa, um trem-fantasma que me fez rir litros e roda gigante. Achei o máximo as mocinhas de chador se divertindo pra valer nos carrinhos de bate-bate. Ali havia música pop turca e muita descontração, tudo que as pessoas no exterior não imaginam que existe no Irã.

Até o presente momento, talvez por ter andado só de carro não vi os tais basijs, a polícia da moralidade iraniana em canto nenhum. Até cheguei a duvidar da existência deles. Ainda bem!

No próximo post vou contar como foi minha despedida de Tabriz e minha chegada em Shiraz!

>> Fiquem com um video do teleférico na montanha Eynali:

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