Viagem ao Irã: De Tabriz a Shiraz

Torre Saat e a sede da administração municipal de Tabriz | Foto: Janaina Elias

Salam amigos da Pérsia, no post de hoje vou contar como foi minha despedida de Tabriz,  e minha chegada em Shiraz:

📆 Tabriz – Irã, 31/08/2013:

De manhã cedinho tive que arrumar minhas malas e me despedir de Tara, que tinha aula na faculdade e de Firuze khanom que ia trabalhar em seu salão de beleza. Como nem o senhor Ebrahim nem seu filho Aras falavam inglês, ele chamou sua adorável sobrinha Mahsa, de 15 anos, para me acompanhar no último tour pela cidade. Mahsa foi a principal interprete na minha primeira noite com a família, ela é educada, sorridente e tem uma face angelical.

Nossa primeira parada foi o Arg-e Alishah ou Cidadela de Tabriz, que se localiza no centro da cidade. Um imponente  monumento do  sec. IV, que é o remanescente de uma grandiosa mesquita e que teve diferentes funções durante as dinastias Safávida e Qajar. Destruído durante um terremoto e sucessivas ocupações militares da região, ele ostenta apenas a grande fachada de 28 metros de altura inteiramente construída em tijolos de barro com seus dois portais. Podemos ver pelos andaimes que sustentam a estrutura e pela diferença na coloração dos tijolos que ele passou por uma recente restauração este ano. Ao lado dele há uma uma importante mesquita.

Arg-e Alishah, monumento histórico em Tabriz | Foto: Janaina Elias
Arg-e Alishah, em processo de restauração após terremoto | Foto: Janaina Elias
Janaina em frente ao Arg-e Alishah, em Tabriz.

Paramos próximo da Mesquita Azul, construída no séc. XV, que não tem nada em comum com sua homônima de Istambul.  O único azul que ali restou, está em sua exuberante fachada (iwan) que conserva uma parte dos azulejos originais antes de ela ficar praticamente reduzida a ruínas por causa de um terremoto em 1778. Essa mesquita atualmente serve como museu e abriga o mausoléu do imperador Jahan Shah  e sua filha. Os túmulos ficam em um câmara no pavimento inferior, onde podemos avistar apenas de longe. Notamos que há um maravilhoso trabalho de restauração no interior da mesquita, onde pela diferença na coloração podemos distinguir as partes originais das restauradas. O guia nos explicou que a restauração foi iniciada em 1973, graças ao esforço de um notável arquiteto de Tabriz e que alguns azulejos infelizmente foram totalmente destruídos o que torna praticamente impossível a restauração completa do exterior.

Ao lado da Mesquita Azul há um parque onde vemos a belíssima estátua do poeta Khaqani. Este parque é frequentado especialmente por pessoas da terceira idade. Na mesma rua, bem próximo está o Museu do Azerbaijão, onde visitamos apenas o primeiro andar, o acervo arqueológico e a exposição das impressionantes esculturas  em bronze do artista contemporâneo Ahad Hosseini (proibido fotografar, portanto Google neles!). O Sr. Ebrahim disse que no andar superior havia um acervo de moedas, mas infelizmente por causa do horário do meu voo para Shiraz, não teríamos tempo de ver tudo.

Exterior da Mesquita Azul de Tabriz, parcialmente restaurada após um terremoto | Foto: Janaina Elias
Pórtico da da Mesquita Azul de Tabriz, que “sobreviveu” ao terremoto | Foto: Janaina Elias
Interior da Mesquita Azul de Tabriz, parcialmente restaurada após um terremoto | Foto: Janaina Elias
Ao lado da Mesquita Azul está o parque com a escultura do poeta Khaqani | Foto: Janaina Elias

No pouco tempo que andamos nas ruas, notei o que passei a chamar de efeito khareji (estrangeira)Em Tabriz as pessoas me olham com curiosidade, especialmente porque estou falando em inglês. Não chego a ser uma quase celebridade como em Talesh, mas segundo os meus amigos, minha face se parece com “a gente morena do sul do Irã” e para os tabrizis que estão no nororeste do Irã, isso já é algo surpreendente.

Na correria de última hora voltamos para o centro, passamos em frente a torre Saat e visitamos o histórico Bazar de Tabriz, que é o maior do mundo e um dos mais antigos do oriente (declarado Patrimônio da Humanidade em 2010). Na verdade, ele é muito mais do que um mero bazar, é um verdadeiro complexo que abriga um labirinto de sub-bazares de várias especialidades (timchehs), está anexado à caravanserais e mesquitas das quais a mais importante é a Jomeh. Sua arquitetura é particularmente charmosa, com grandes corredores, arcos ogivais de tijolos avermelhados e domos com aberturas em formato de octógono por onde entra a luz solar

No bazar Amir vemos ouro que não acaba mais e no Mozzafarieh, um setor totalmente dedicado aos tapetes. Há reproduções de pinturas perfeitas, emolduradas, mas no lugar da tela pintada à óleo, pasmem, são trabalhos de tapeçaria! Não havia tempo nem possibilidade para compras, enquanto caminhávamos espremidos na multidão, mercadores passavam no meio dos corredores com seus carrinhos abarrotados de tapetes e tecidos gritando: Yallah!!! Se ficar parado é atropelamento na certa!

Bazar Mozzafarieh, um dos setores do Grande Bazar de Tabriz | Foto: Janaina Elias

Meu voo para Shiraz estava marcado para as 14:30, minha frustração foi não ter conseguido  tempo de visitar o Maqbaratshoara (mausoléu do poeta Shahriar). No aeroporto, antes de seguir para a sala de embarque me despedi de Mahsa, Aras e o Sr. Ebrahim.

O aeroporto de Tabriz até que estava bem tranquilo, mas a rotina de passar pelo raio-x e detector de metais sempre me deixava estressada, ainda mais com as funcionárias de chador a me revistarem. Ali até que eram mais simpáticas, perguntaram de onde eu era e após verem meu pingente de metal, me deixaram passar tranquilamente. Dei graças a Deus por aquela ser  minha última viagem aérea dentro do Irã!

No salão de embarque perguntei para um moço se ele falava inglês, e mostrei meu bilhete para saber se eu estava no lugar certo. Ele não falava, mas depois chamou a esposa que conversou comigo. Na fila do portão, vendo que eu estava excessivamente preocupada em ajeitar o véu, ela disse: “Está ótimo, relaxe!” Ela e o marido eram jovens mas ao saber que eu estava sozinha, a moça me olhou com um certo espanto e disse: “Mas você parece tão jovem…”

Finalmente embarcamos no voo da Aseman Airlines, onde eu  me sentei em uma poltrona do fundo, sem vista para a janela. Ao meu lado havia uma poltrona vaga e na do corredor sentou-se um rapaz bonitão. Teve uma refeição bem iraniana com arroz, frango e mast. As bebidas eram Pepsi e o tradicional chai. Mas o barulho durante o voo era ensurdecedor e na hora de pousar o avião deu uns solavancos tão bruscos que eu tive que abraçar a poltrona da frente.

Aeroporto Internacional de Shiraz (Foto: Panoramio)

Cheguei às 16:20 em Shiraz e quem me esperava no aeroporto era um completo desconhecido. O senhor Alireza, que não falava inglês e foi enviado de última hora pelo amigo Majid de Teerã, para me socorrer. Após pegar minha mala eu liguei para ele e disse em persa que estava usando roupas verdes e num instante ele me localizou. Ele era um senhor todo sorridente com cabelos grisalhos, barba comprida, roupas simples. O senhor Alireza pegou minhas malas e colocou em sua  velha camionete, e pedindo desculpa pela falta de luxo do veículo me levou até o hotel, falando persa com seu sotaque shirazi.

Naquela hora meu cérebro deu um curto circuito, eu me esforçava em vão para entendê-lo. Dei o endereço do hotel, mas ele estacionou na frente do hotel Pars, que não era o meu hotel, mas o endereço de referência. Meu hotel era um menorzinho que fica do outro lado da rua, chamado hotel Payam. O sr. Alireza agiu praticamente como um pai, me ajudando na recepção, onde apenas uma funcionária falava ingles. Tenho que pagar adiantado pela noite que vou passar e meu passaporte fica retido na recepção.

Confesso que me assustei um pouco com a aproximação do sr. Alireza ao subir com minhas malas e entrar no meu quarto. Mas depois ele me chamou para tomar um sorvete, ao lado do magnífico Arg-e Karim Khan, que ficava na quadra virando à esquina próxima do hotel. Tomamos um delicioso sorvete de água-de-rosas sentados em um banco diante do Arg de Shiraz. Com meus precários conhecimentos em persa ainda obtive a informação de que ele é um dervixe e sua esposa se chama Fariba, tem dois filhos pequenos. Perguntou se eu queria ir à sua casa jantar, mas fiquei com receio de não agradar a esposa.

O magnífico Arg-e Karim Khan, em Shiraz | Foto: Janaina Elias

Era um final de tarde com temperatura agradável em  Shiraz. Vejo rostos diferentes, gente mais morena, algumas mulheres pedem dinheiro. Uma menininha com trajes bandari (do sul) carregando um pão com os olhinhos brilhando, me lembrou a cena de um filme de Kiarostami. Me despedi do Sr. Alireza e voltei para o hotel me sentindo bem cansada.

Meu quarto é simples mas confortável, tem ar condicionado, duas camas de solteiros, TV, um tapete de oração, banheiro ocidental. Só me sentia meio insegura com as cortinas precárias que cobriam os vidros da porta e da janela. Em Shiraz, estou completamente sozinha! Olhei para minha geladeira vazia, comecei a sentir falta dos mimos das famílias… Tomei banho e deitei para descansar tentando assistir qualquer um dos canais oficias do governo que transmitiam orações, seriados, programas de auditório, documentários sobre o país. Parei em um canal que falava sobre Yazd, meu próximo destino. Até que um amigo do senhor Alireza chamado Ali, que fala inglês, me ligou e perguntou se eu precisava de alguma coisa e disse que me ligaria no dia seguinte para me guiar em Shiraz. Comi algumas frutas, os biscoitos klucheh e uns chocolates que ainda restavam em minha bolsa e fui dormir. Assim foi minha chegada em Shiraz…

No próximo post vou contar como foi minha visita à Persépolis, Naghshe Rostam e mais um pouco de Shiraz. Até a próxima!!

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