Salam amigos! Com vocês, mais um capítulo da minha odisseia pelas terras da Pérsia:
📆 Talesh – Irã, 29/08/2013:
Dia de me despedir da minha família em Talesh. Estava ficando acostumada com a simplicidade da casa e com a amabilidade deles. Confesso que de vez em quando chegava a ficar aborrecida com o excesso de mimos. Como eu disse, no Irã se o hóspede é um presente de Deus, em Talesh, é quase um deus! A coisa chegava ao ponto de eu não poder levantar um prato do lugar depois do almoço. Se eu estivesse sozinha por um momento pensando na vida, eles vinham perguntar: “Você está bem, está precisando de alguma coisa? Não está confortável aí? ” Mas por outro lado, era confortante estar com uma família tão carinhosa em um país estrangeiro.
Esta tarde, eu passaria aos cuidados de outra família que eu não conhecia em Tabriz, na casa de Firuze khanom que também é parente de minha amiga Afsaneh. Além dessa família, eu também ia conhecer um novo amigo Mohsen, jovem estudante de medicina que gentilmente se ofereceu para me guiar por lá.
Naquela manhã, fomos bem cedo para a casa de campo da avó de Peyman e Maryeh. Não tive a oportunidade de conhecer a avó porque ela havia viajado para Mashhad, onde eu estive há 4 dias antes. Aprendi que todo mundo que vai a Mashhad visitar o santuário do Imam Reza recebe o nobre título de mash. Por isso os irmãos inventaram de me chamar masha Jana, o tempo todo, às vezes querendo brincar com a minha a cara.
A casa de campo era de 2 andares, rústica, de madeira, totalmente tradicional, mas com energia elétrica, água corrente e telefone. No andar de cima ficava uma sala com uma grande janela de onde podíamos ver a paisagem que tanto me encantava meus olhos no Gilan. No quintal havia galinhas, carneiros e um pomar com romãzeiras, figueiras, nogueiras tomateiros e outras plantas rasteiras que não conheço, inclusive uma delas resolveu alojar um espinho em minha sapatilha e por um triz não espetou meu pé! Como era verão, os frutos ainda estavam verdes ou nem haviam brotado.
Os irmãos de Talesh, adoram tirar fotos! Principalmente Peyman que pegava a minha câmera e toda hora dizia : “Este lugar é bonito, tira uma foto aqui vai…”Tiramos bastante fotos no pomar e almoçamos o tradicional kebab de frango com arroz. Como estava só a família ali no sítio, podíamos ficar à vontade com as roupas. De modo que quando postei minha primeira foto para os amigos no Facebook eles se chocaram de como eu estava ali no Irã, sem hejab e com os braços de fora!
À tarde fomos para a cidade de Astara que é na costa do Mar Cáspio quase na fronteira com a República do Azerbaijão onde era possível ver algumas placas no alfabeto russo. Ali visitamos Mohammad agha, tio paterno de Peyman e Maryeh, um senhor de cabelos brancos encantador, quase uma cópia idêntica do pai deles. Ele falava um pouco de inglês, e me recebeu em sua linda casa com doces, chocolates, pistaches e me mostrou a foto de sua falecida esposa e seus belos filhos.
O próprio tio Mohammad, fizera questão de comprar minha passagem para Tabriz, e foi com a família se despedir de mim no terminal. Ali ao lado do ônibus que eu partiria, voltou toda a cena do nosso encontro no aeroporto, da emoção, dos abraços porém agora Maryeh e a mãe tinham lágrimas nos olhos. Ao subir no ônibus eu chorava demais, não conseguia imaginar minha vida sem eles daqui pra frente no Irã. Pela janela vi todos dando tchauzinho para mim e fiquei olhando para eles aos prantos até o ônibus partir…
Peguei a estrada, 6 horas de viagem, em uma magnífica estrada que novamente me lembrava a nossa Serra do Mar. Até mesmo ali havia barracas e pessoas fazendo piquenique na beira da estrada. Aliás, uma das únicas coisas que enfeavam o lugar era o lixo que as pessoas deixavam espalhado por toda parte. O ônibus não era lá um luxo, mas a cadeira ao meu lado estava vazia e a família havia me abastecido com uma sacola enorme de frutas e salgadinhos que eu não consegui comer.
Houve uma parada no meio do caminho, mas eu permaneci dentro do ônibus. Percebi que todo mundo falava turco no ônibus, fiquei imaginando se seria assim em Tabriz também. Lá pelas alturas de Ardabil, província à meio caminho entre Gilan e Azerbaijão Oriental, uma mulher sentou ao meu lado e perguntou alguma coisa indecifrável para mim. Respondi: bebakhshid, man turist hastam… (Desculpe sou turista…) e ela perguntou depois se eu falava farsi khub. Nossa conversa se limitou há umas poucas palavrinhas, mas ela desceu antes de Tabriz e disse: Khoda hafez!. Confesso que me dava nervoso às vezes de ouvir minha família em Talesh falando em turco. E agora 6 horas de viagem ouvindo desconhecidos proseando alto naquela língua incompreensível!
A estrada chegando na província do Azerbaijão Oriental, parece coisa de filme. Uma paisagem de campos extensos, tendas e rebanhos de cabras e carneiros. As montanhas são mais áridas e é algo que me lembrava as fotos que eu havia visto em livros da Anatólia na Turquia.
Cheguei em Tabriz lá pelas 20:00 da noite. Mohsen já estava me esperando no terminal. Como eu o reconheci sem nunca tê-lo visto antes? Ele simplesmente me chamou no celular e quando atendi ele já veio em minha direção dizendo: Hello, are you miss Janaina? Ele tem 21 anos, fala inglês razoavelmente, é sorridente, educado, com uma cara de estudioso. Veio acompanhado de outros 2 rapazes, um deles era seu primo. Os outros rapazes não falavam inglês, mas me pareceram igualmente simpáticos e respeitosos. Eles pegaram minha malas, chamaram um taxi e me deixaram na porta do apartamento de Firuze khanom. Mohsen disse que me ligaria no dia seguinte e iríamos conhecer Kandovan.
A “minha casa” em Tabriz é um apartamento bonito, bem mais ao estilo ocidental, como aquele em Teerã. Não tinha tapetes na casa toda, de modo que eles me ofereceram um par de sandálias para não pisar no chão frio. Como de costume me alojaram no quarto das meninas, onde havia 2 grandes panteras de pelúcia. A família adora gatos, tem um cinza que se chama Pishani que adorou deitar no meu shal. Firuze khanom e o seu marido, o senhor Ebrahim, são muito amáveis. A jovem Tara e o garoto Aras são seus filhos.
Na hora do jantar, conheci as sobrinhas do casal. Na verdade, saí do quarto e todas já vieram em minha direção me beijando e abraçando uma a uma. Os doces e as balas de café que eu dei de presente fizeram o maior sucesso. Pediram para mostrar minhas fotos, ligando a câmera na TV da sala. Então, ali me dei conta que havia esquecido o cabo USB da câmera em Talesh e, sem ele eu não poderia carregar a câmera… Tara disse que ia tentar encontrar um cabo emprestado no dia seguinte, e nós assistimos as fotos colocando o cartão de memória na TV da sala.
Ao perceber minhas tentativas atrapalhadas de me comunicar com eles em persa, o senhor Ebrahim advertiu em um tom de voz enfático: Tabriz NO farsi, Tabriz turkish! Isto quer dizer que em Tabriz as pessoas falam turco e não persa, embora as placas da cidade estejam todas em persa e nas ruas se encontrem pessoas falando persa, o povo das províncias do Azerbaijão Oriental e Ocidental, os azeris se consideram mais turcos do que iranianos. Depois ele me mostrou um livro com todas as maravilhas das províncias do Azerbaijão Ocidental, alguma das quais gostaria de me levar para conhecer se eu não tivesse tão pouco tempo com eles. Meu voo para Shiraz, já estava marcado para o dia 31 à tarde.
No próximo post, vou contar como foi minha visita ao vilarejo de Kandovan e meu primeiro dia super emocionante em Tabriz.
>> Fiquem com um pequeno registro estrada entre Astara e Ardabil: